EM CONSTRUÇÃO

Ainda procuro respostas sobre mim.
Me (re) conheço e me descubro em livros,
filmes,
lugares.
Me (re) conheço,
me cubro
e me descubro
em muitas pessoas que passam pela minha vida.
Me iludo.
Ora como num espelho de cristal.
Me desiludo.
Ora como num espelho distorcido.
Me engano, amo, odeio.
Gosto de pessoas, de nomes.
Prefiro a con-vivência, por mais difícil que ela possa aparecer.
Gosto do outro que aumenta meus galhos,
que estende minhas raízes,
que prova meus frutos.

Sou mais árvore que pessoa,
muitas vezes.
Árvores que crianças se penduram,
que passarinhos sobem em cima,
que faz sombra.
Sou lembranças da rua de paralelepípedo,
das Maria-sem-vergonhas num passado que não sei se é sonho
ou se foi realidade,
do caminhãozinho de madeira na rua de areia,
das leituras de contos de fada com a mãe e a irmã na cama.
A cama daqueles que precisam não somente divi-la,
mas precisam aprender desde pequenos a dividir
o pão,
a comida,
a roupa.
Daqueles que ensinam,
sem nunca terem tocado na palavra,
solidariedade.
Sou um pouco de Graziela, Dirceu. Simone. André.
Manoel, Ângela, Jean,
Albert, Franz, Luciana, Zé,
Luiz, Vitor, Isabela, Rogério,
Zanon, Chico, Fábio, Mariana,
Carlos, Diana, Clarice, Beto,
Milton, Leandra, Augusto,
Oriana, Xico, Heitor...
Costuro minha vida com nomes,
pessoas,
paisagens,
sentimentos.
E me cubro com essa grande colcha de retalhos todas as noites.
Colcha mágica que me proporciona um emaranhado de lembranças,
sensações,
sentimentos
que se materializam em sonhos muitas vezes inverossímeis.
Tenho várias caras.
As vezes elas são bonitas,
outras vezes, nem tanto.
O corpo também varia.
Varia de acordo com o olhar.
De acordo com o desejo.
Muitas vezes sou inquieta,
áspera
e desesperançada.
Tenho amor dentro de mim,
mas nem sempre sei usa-lo.
As vezes me arranha feito farpa.
Era mais ou menos assim o poema?
Não sei. Mas ele me habita.
Amor deveria vir com bula,
com instruções.
Amor de mãe,
de irmão,
de amigo,
de amor.
Não deveria vir com dor, com sofrer, com chorar.
Mas como diz o poeta,
se nao tivesse tudo isso,
melhor era tudo se acabar.
A burocracia mataria o amor.
Só o inesperado o alimenta.
"As coisas rasteiras me celestam".
Tenho inclinação pra vadiagem.
A montanha me imensa e me diminui.
O mar me invade com sua fúria incognoscível.
A cachoeira,
Oxum.
Opero por semelhanças.
Comparo pessoas com flores,
com cães,
gatos,
pedras,
músicas,
super- heróis,
seres mitológicos,
seres fantásticos.
Gosto das palavras
(das ditas e escritas).
Principalmente daquelas que têm cor,
cheiro, barulho,
que fazem rir e chorar,
que reavivam a memória.
Palavras que têm vida própria.
Desejo a felicidade,
mesmo sabendo que ela é uma fatalidade.

(2006)

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