As flores e a Náusea
Um dia cheguei num campo repleto de flores,
Mas a náusea estava por toda a parte
Havia alegria e esperança em mim
As flores me alegravam
Me enfeitavam
Me animavam
Mas a náusea e seu cheiro eram tão fortes que fui me curvando, me desanimando, me embriagando
Eu que antes era nuvem, árvore, pássaro
Fui virando coisa indefinida, maltratada por minhas dores, coisa cansada, inanimada

As flores continuavam lá
Alegres
Vivas


Como conseguiam sobreviver?
Eram tão frágeis
Mas como eram fortes
Eram mais fortes que tudo
Suportavam a dor, a fome, a doença
Mesmo em face do maior descuido: sobreviviam

As vezes eu ia lá e regava
As vezes eu ia lá e pisava
Eu chorava de alegria e dor
Eu me arrependia
Eu me retratava com carinhos às flores
E elas sempre estavam lá
Sorrindo pra mim

Eu percebia que se eu regava elas tornavam-se cada vez mais belas e vivas e prestimosas
Mas quando eu descuidava e as esquecia elas murchavam, elas se tornavam más

Gritei palavras de ordem
Protestei
Clamei
Pedi em nome das flores
Elas eram inocentes e imaturas. Não sabiam pedir por si.
Mas a náusea era tanta que me calei
Calei com pena de mim
Calei com medo da honra
Calei com medo da coragem

E a náusea, a náusea estava lá,
Traçando seus planos de controle
Exercitando sua indiferença.
Destruindo com sua indiferença
Usando palavras doces para dissimular sua acidez.
A náusea um dia, meu deus! Já foi flor.
(Alessandra Gomes)

Comentários

olhodopombo disse…
Voce eh uma poeta incrivel!
vou vir sempre por aqui...

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