A ponte


Ontem, ao ver uma manada de bois num filme de referência à Guimarães Rosa,

lembrei de você.

Mas porque me lembrei de você, ao ver uma boiada?

Na verdade,

Ao ver a boiada

minha memória foi ativada para as imagens das cenas dos bois que eram vendidos embaixo da ponte que atravessa aquele rio.

Bois, ponte, você.

As imagens eram iscas para a memória.

As imagens pescando a memória

A memória morde a isca e, incorporando-a, vira imagem.


Os bois eram a desculpa para lembrar-me de você que estava ali, guardado, esperando para ser lembrado.

Você estava ali o tempo todo. Os bois foram te resgatar.

Ao pensar na imagem dos bois, cavalos e jegues que eram vendidos ao sábado

(imagem que eu gostava tanto, porque me transportavam pra algum lugar imaginado, vivido em histórias de livros ou em minha vida mesmo, lugar cheio de boiadeiros, sertanejos, cavaleiros com seus casacos e chapéus de couro)

pensei fugazmente que não poderia mais andar pelas ruas daquela cidade se não fosse em sua companhia.

Não faria sentido andar pelas ruas que aprendi a amar junto a você.

Você vem colado à rua,

à paisagem.

Você os compõe.

A paisagem sem você não é a paisagem completa.

Fugazmente

lembrei da noite que sentados ficamos no banco na beira do rio.

Era Janeiro?

Era a cidade do outro lado do rio.

Eu usava short jeans e lenço verde na cabeça.

Você, camiseta vermelha.

Seu cabelo ainda era um pouco curto.

Um pouco.

Eu lembrei por causa da foto.

A foto expressava carinho.

Eu lembrei da foto

(e só dela eu lembrava)

em que eu andava sobre os trilhos do trem

buscando , talvez, o equilíbrio que nunca encontrei...

(Bahia, dezembro de 2010)

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